Ao romper do dia, sentei-me na campina, travando conversa
com a Natureza, enquanto o Homem ainda descansava sossegadamente nas dobras da
sonolência. Deitei-me na relva verde e comecei a meditar sobre estas perguntas:
Será a Beleza Verdade?
Será Verdade a Beleza?
E em meus pensamentos vi-me levado para longe da
humanidade.
Minha imaginação descerrou o véu de matéria que escondia
meu íntimo. Minha alma expandiu-se e senti-me ligado à Natureza e a seus
segredos. Meus ouvidos puseram-se atentos à linguagem de suas maravilhas.
Assim que me sentei e me entreguei profundamente à meditação,
senti uma brisa perpassando através dos galhos das árvores e percebi um suspiro
como o de um órfão perdido.
“Por que te lamentas, brisa amorosa?” perguntei.
E a brisa respondeu:
“Porque vim da cidade que se escalda sob o calor do sol,
e os germes das pragas e contaminações agregaram-se às minhas vestes puras.
Podes culpar-me por lamentar-me?”
Mirei depois as faces de lágrimas coloridas das flores e
ouvi seu terno lamento... E indaguei: “Por que chorais, minhas flores
maravilhosas?”
Uma delas ergueu a cabeça graciosa e murmurou: “Choramos
porque o Homem virá e nos arrancará, e nos porá à venda nos mercados da
cidade.”
E outra flor acrescentou:
“À noite, quando estivermos murchas, ele nos atirará no
monte de lixo. Choramos porque a mão cruel do Homem nos arranca de nossas
moradas nativas.”
Ouvi também um riacho lamentando-se como uma viúva que
chorasse o filho morto, e o interroguei: “Por que choras meu límpido riacho?”
E o riacho retrucou:
“Porque sou compelido a ir à cidade, onde o Homem me
despreza e me rejeita pelas bebidas fortes, e faz de mim carregador de seu
lixo, polui minha pureza e transforma minha serventia em imundície.”
Escutei, ainda, os pássaros soluçando e os interpelei:
“Por que chorais meus belos pássaros?”
E um deles voou para perto, pousou na ponta de um ramo e
justificou:
“Daqui a pouco, os filhos de Adão virão a este campo com
suas armas destruidoras e desencadearão uma guerra contra nós, como se fôssemos
seus inimigos mortais. Agora estamos nos despedindo uns dos outros, pois não
sabemos quais de nós escaparão à fúria do Homem. A morte nos segue, aonde quer
que vamos.”
Então o sol já se levantava por trás dos picos da
montanha e coloria os topos das árvores com auréolas douradas.
Contemplei tão grande beleza e me perguntei:
“Por que o homem deve destruir o que a Natureza
construiu?”
Khalil Gibran
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