Além do horizonte, existem outros mundos a serem descobertos.
Lá, folhas não caem, elas flutuam.
Lá, o meio de transporte são pássaros que vem até você e com o suspiro de seu amor, neste mundo todos andam de mãos dadas lá é aonde a harmonia toma conta da natureza de todas as espécies viventes.
Lá, não colhemos flores, mas as flores colhem a gente.
Chegou o tempo de despertar e acreditar que esta vida vale apena ser vivida.
-Rhenan Carvalho-

sábado, 13 de julho de 2013

A Pena do filme "Forrest Gump"

( extraído do texto:"A pena de Forrest Gump",
de Marco Antonio Spinelli-Psiquiatra e Psicoterapeuta)

- Vó?
- O que?
- Ontem eu vi de novo aquele filme que você gosta.
- Qual, minha querida?
- Aquele , daquele homem que é meio bobo e fica contando
histórias no ponto de ônibus...

- Ah, sei ... Forrest Gump...
- Isso.
- E você gostou do filme?
- Gostei, mas não entendi uma coisa...
- O que?
- Quando começa o filme, tem uma pena voando, que voa, voa, e cai no
colo do Forrest Gump.
Ele guarda "ela"no livro e começa a contar a história para
um monte de gente.
- Exato.

- Então, no final, ele abre o livro e ela sai voando outra vez.
Para que serve essa pena, heim, Vovó?
- Talvez você não tenha percebido minha linda, ele explica isso no final.

- Forrest Gump não é uma pessoa igual às outras:
ele tem uma inteligência limítrofe.
Não fale que ele é meio bobo que isso é muito feio.
Ele tem uma inteligência de uma criança de cinco anos,
por isso tem dificuldade de entender as coisas
como as outras pessoas.
Você quer saber por que a pena começa voando
até pousar no colo do Forrest Gump, e depois sai
voando de novo, não é?
- Isso.

- Então..., no final do filme, ele conta que na sua vida houve
duas pessoas que o influenciaram muito: uma foi a sua mãe,
a outra, seu amigo, que ele conheceu na guerra do Vietnã,
que é o tenente Dan.

A mãe ensinou para ele que ter uma deficiência não é
desculpa para desistir da vida.
Ela se recusou a colocá-lo em uma escola para deficientes,
e sempre empurrou o filho para frente, ensinou-o
a não se conformar com as suas próprias limitações.

Forrest foi para a escola, estudou, teve um problema
na coluna que o obrigou a usar aquele aparelho horrível,
você se lembra?
- Lembro sim.

- Tem uma cena que é a minha preferida , que é aquela em que os meninos valentões correm atrás dele numa caminhonete.
Eles querem caçoar dele e até machucá-lo, e a sua amiguinha grita:
- Corra, Forrest, corra !

E ele sai correndo, de aparelho e tudo, a caminhonete
atrás dele, os meninos caçoando..., e à medida que ele corria,
o aparelho vai caindo, pedaço por pedaço, e quanto mais
ele se livrava do aparelho ortopédico, mais rápido
ele conseguia correr, mais ele deslanchava, até entrar
correndo em um campo gramado e sumir ao longe,
deixando para trás os seus perseguidores...

- Vó?
- O que?
- Você está chorando?
- Não, ... é que eu esquecí de pingar o colírio
(falou isso enquanto enxugava algumas lágrimas).

- Por que você gosta tanto dessa cena, Vovó?

- Porque eu acho essa cena muito emocionante. Ela tem um significado maior
do que está na tela.
- Qual o significado?

- Na vida, a gente fica tentando endireitar tudo, e às vezes temos que passar muito, muito medo para podermos nos livrar de nossos aparelhos, de nossas muletas.

Forrest descobre que já está pronto, que pode correr como ninguém, e mais longe do que qualquer menino valentão e bobo que se acha grande coisa ...

Olhou para a neta, que a olhava fixamente.
- Vó?
- O que?
- É para isso que temos medo?
- Acho que sim.
- Temos medo para tirar as muletas?
- E os aparelhos. E ir para frente.
- Legal.

- Fala vovó..e a pena?
- É mesmo meu amor, já ía me esquecendo...

Eu te contei que a mãe de Forrest Gump o ensinou a nunca sentar sobre seus problemas, a nunca se intimidar com as suas dificuldades.
Ela ensinou pra ele que, na vida, Deus dá uma série de cartas para a gente jogar o jogo, e temos que aproveitar as nossas cartas do melhor jeito possível.

- E a pena?
- Já vai, já vai... a outra pessoa importante na vida de Forrest Gump é seu amigo,o tenente Dan, certo?
Juntos, eles foram para a guerra, tiveram um pesqueiro, montaram uma empresa e ficaram muito ricos.

E o tenente Dan ensinou que na vida, a gente é como uma peninha levada pelo vento, de um lado para outro, e nunca tem como descobrir para onde vai o sopro de Deus..., nunca a gente sabe para que lado vai a pena.

Fez um silêncio grave.
- Como assim?
- Quando você crescer, vai perceber como nosso destino é caprichoso, meu amor..

Um dia estamos aqui, outro dia estamos lá, como se tivesse alguém assoprando a vida pra lá e pra cá, pra lá e pra cá.

- Quer dizer que a gente não sabe para onde vai essa pena ?
- A gente não sabe... mas, quando você chegar na idade que chegou a Vovó , vai perceber os caminhos misteriosos que a pena toma no ar, até pousar, segura, no colo de Deus.

Mas isso a gente só descobre depois de passar muito tempo tentando
adivinhar.

- Vó?
- Oi?
- O que acontece quando a gente pára de tentar adivinhar
para onde vai essa pena?
- A gente se deixa levar pelo vento, minha querida.

A gente joga da melhor forma que puder, com o máximo de empenho, mas também respeita as linhas do vento.

- Gostou?
- Gostei, gostei muito... sabe, Vó, será que um dia esse vento vai te levar pra longe de mim?
- Não, meu anjo... por mais longe que vão nossas penas,
nosso coração vai estar sempre perto um do outro, tá bom?
- Tá bom.

Ficaram num silêncio de fim de conversa.
- Eu vou brincar um pouco, tá?
- Isso, vai brincar de Forrest Gump.
- Vou correr até cansar.
- Isso. Vai mesmo.


Mal conseguiu disfarçar a voz embargada de lágrimas.